Imigrar: as famílias que vêm e as que voltam para o Brasil

Desde que me mudei do país, já vi muitas famílias chegarem, mas também muitas voltarem para o Brasil. Nesses quase 300 dias em que estou em Portugal, já entendo um pouquinho sobre os sentimentos que nascem junto com a decisão de imigrar. Já passei por quase todas as datas importantes e adaptações que imaginei que seriam muito difíceis ou impossíveis. Foram aniversários de familiares, feriados importantes, carnaval, páscoa, férias, ano novo. Só não posso falar do Natal, porque esse passei no Brasil. Já percorri também todas as modalidades de repartições públicas para finalmente fincar pé nesse lugar pelo qual me apaixonei à primeira vista.

Mas não foi das datas e documentos que vim falar hoje. Quero escrever sobre aqueles que saíram do nosso país para viver aqui e voltaram, mesmo depois de todo o esforço que uma mudança dessa proporção exige, e os motivos que fazem com que essas pessoas repensem a decisão de deixar o seu país, dizer adeus a parentes e amigos e voar.

Aqueles motivos que deram o pontapé na mudança muitas vezes perdem o valor diante dos novos desafios geográficos, culturais e psicológicos. São muitas adversidades a serem enfrentadas, e para muitas delas não estamos preparados. Alguns encaram e vão em frente, enquanto outros acham que não vale a pena continuar. Depende da história e das prioridades de cada um, afinal, viemos para esse mundinho para sermos felizes e temos que correr atrás dessa felicidade custe o que custar. Esse custo pode ser, algumas vezes, só o da passagem de volta para o seu país.

As diferenças e dificuldades

Aqui não tem churrasco com os amigos todo final de semana, aliás nesse quase um ano aqui comi churrasco uma única vez. Foi na casa de um amigo também brasileiro a 347 km de distância da minha casa . Foi ótimo, guardo aquele sabor em um lugar especial da minha memória.

Os vizinhos não serão seus amigos, a não ser que você tenha a sorte que eu tive com os meus vizinhos de andar. Em grande parte das vezes, você não os conhece, e aconselho: não tente ser demasiado simpático, não dará certo. Mas se os seus filhos fizerem barulho, é bem possível que um deles bata à sua porta e fique muitos minutos explicando porque os seus tesouros não podem fazer aquilo, apesar de pedir imensas desculpas por se tratar de crianças. Mesmo assim sinta-se feliz! Porque se tem vizinhos é porque conseguiu alugar um lugar para morar. Confiem em mim: isso não é uma tarefa fácilpara um imigrante sem histórico em Portugal.

Em uma fila, mesmo que de horas, não há assunto para se falar. Você não saberá o nome da pessoa à sua frente, a não ser que ele seja nosso conterrâneo.

A burocracia por muitas vezes supera a brasileira. Em algum momento você sofrerá preconceito, mesmo que tenha dupla nacionalidade, seja ela portuguesa, italiana, alemã, austríaca, espanhola, grega, lituana… Enfim, abriu a boca e falou “português brasileiro” é brasileiro! A lei até diz que quem tem nacionalidade dos países da zona do euro nem imigrante é, mas o seu sotaque te denuncia.

Você fará muitos novos e queridos amigos, brasileiros e portugueses, mas continuará a sentir muita falta daqueles que fez na infância. Brasil e Portugal se conhecem há mais de 500 anos, mas não são exatamente íntimos. Essa amizade ainda está sendo construída.

Por que voltar? 

Somam-se as dificuldades encontradas na sua nova morada às histórias, expectativas e sonhos por trás de cada um de nós. Essa conta resultará na adaptação no novo país ou na decisão de voltar ao Brasil.

Cada ser humano vem com uma bagagem de história muito especial e exclusiva. Conheci algumas desde que cheguei aqui. Alguns deixaram um parente doente. Outros dividiram a família porque um dos membros já tinha seus projetos no Brasil. Os filhos não se adaptaram à cultura e à escola. Ou, ainda, vieram sem entender que o salário, mesmo sendo em euro, não será cinco vezes maior do que o do Brasil. Não adianta converter e usar como base o seu custo de vida aí – você ganhará em euro, gastará em euro e o seu salário será proporcional à economia do país.

Enfim, são tantas histórias que não caberiam em um só texto. Vou finalizar com uma que é mais comum do que imaginamos. Um conhecido veio morar aqui com a família, contratado por uma multinacional, e voltou em menos de um ano da mudança. Um parente adoeceu e a escolha dessa família foi voltar definitivamente para o Brasil. Essas coisas acontecem. Essa família estava com emprego, bom salário, bom apartamento, crianças na escola, mas chegou um componente surpresa que fez com que a história mudasse o rumo. Conheço histórias bem semelhantes em que a família deu todo o suporte daqui, mas não voltou.

Imigrar é um desafio. Tem alguém errado? Não. São apenas escolhas.

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